oi Vida!
Só se olha quem está disposto a refletir. Sem filtro, sem maquiagem, eis ali nossa realidade, nua e crua.
Oi Vida! Cá estamos neste 26 de março, o mesmo dia em que, há 53 anos, a gente se olhou pela primeira vez. Tantas mudanças, estradas, chegadas e partidas, encontros, desencontros, tantas lágrimas e sorrisos que a gente já viveu juntas hein... que coisa boa hoje esse papo reto e direto; eu e você, você e eu.
Nessa época de completar mais uma volta ao redor do sol me pego pensando como é linda, potente e delicada essa viagem que fazemos juntas, hein? Fragilidades não nos furtam a força, acho isso uma lindeza!
Só você sabe o quanto desejei ser adulta e erroneamente julguei glamourosa a rotina das responsabilidades. Mas curti todas as fases, sem pular nenhuma, e isso por si só é um privilégio.
Eis que a vida adulta chegou e tudo aconteceu como foi possível! Entre experiências passionais típicas de uma ariana, você foi mostrando que o amor mora nas coisas pequenas e simples do dia-a-dia, não exatamente nos grandes sonhos, como vemos nos filmes. Sem existir tempo certo ou incerto, as escolhas se espalharam à mesa, exatamente como as cartas no jogo de canastra que me distrai nas noites livres.
Finalizando a faculdade de direito, ensaiei a de contabilidade – mas depois de repetir mais de uma vez a cadeira de matemática financeira, larguei. Entender que desistir também é opção foi dos maiores aprendizados. Era hora de trabalhar e ser alguém que paga suas próprias contas; só não imaginava que fossem tantos boletos juntos, todos os meses, mas como dizia minha musa Rita Lee, são coisas da vida.
A maternidade chegou cedo, e juntas, aos 27 e quase 30, geramos outras duas vidas, que muito cuidamos e hoje pertencem ao mundo, como as pessoas insistem em afirmar. Eu sei, você sabe, quase todo mundo sabe, esse papo que os filhos são do mundo deve ser autoria de alguém que nunca sentiu o coração partido quando bebês já quase adultos partem para suas próprias viagens. Depois veio novamente você, Vida, com essa conversa de que os filhos têm de ter seus próprios arbítrios. Longos papos nossos, muita terapia e cá sigo cuidando as meninas, mesmo que, por vezes, à distância.
Além do amor incondicional, que eu tanto lia mas pouco entendia, o maternar me apresentou uma nova habilidade, que devia habitar escondida em alguma gavetinha dentro de mim; ao entender que através do fazer manual seria possível me comunicar com o mundo, e assim o fiz! Aos 39 meti a cara num novo mercado, e em 2010 uma artesã/artista timidamente inaugurada pediu licença à advogada para pisar nas desconhecidas terras do empreendedorismo. Perdi as contas das batidas de cabeça, dos tapas na cara, dos tombos nos tapetes sorrateiramente puxados, exatamente do jeitinho que você, Vida, nos explica na teoria das coisas. Perdi as contas dos sorrisos, celebrações e agradecimentos por cada conquista. Penso que seja a força do eterno recomeçar que nos impulsiona nessa estrada. Gosto disso.
Em 2018/19 coloquei 270 mts de uma casa cor de rosa repleta de histórias para morar em 83 paginas de um livro, o Relicário de Afetos, e com uma mala de rodinhas, mais uma vez, eu e você pisamos juntas na estrada.
Logo adiante, nos primeiros ventos da pandemia, ao perder o pai para aquela doença que não gosto nem de dizer o nome, foi preciso recalcular a rota. Mais uma vez, lá fomos nós! Época difícil de compreender minha própria rosa dos ventos, quando mesmo nos dias ensolarados parecia haver uma tormenta nos perseguindo a cada passo. E a gente se segurou; eu e você, você e eu.
Nessa breve viagem cronológica, hoje nos observo com atenção frente ao espelho. Exatamente nesse objeto que tantos sarcasticamente dizem ser o único amigo dos narcísicos, é possível nos olhar sem amarras, do exato jeito que a gente é, e isso, querida Vida, é potente demais! Só se olha quem está disposto a refletir. Sem filtro, sem maquiagem, eis ali nossa realidade, nua e crua.
Dentre idas e vindas, encontros e despedidas, relações pessoais e profissionais saudáveis e tóxicas, o olhar generoso da maturidade hoje me faz perceber a verdade-verdadeira que Lulu Santos cantou em Como uma Onda, lá nos anos 80. E daqui, num eterno indo e vindo infinito, celebro esse início de mais um ciclo, com a saúde que me é concedida, com os amores e amigos que chegam e decidem ficar, com as escolhas diárias e com muito amor nesse coração regido pelo signo de áries.
Celebramos mais um ano juntas, com desejo de muitos à frente!
Beijos meus